Ponto final

Por Vanessa Pinho

Estranho começar um texto com ponto final. Mas é o que tenho para o momento.

Mais estranho seria se eu começasse o texto de forma normal, como todo escritor começa, até porque, faz um ano que vocês me conhecem e sabem que de normal tenho pouco. Talvez uma coisinha ou outra, como a mania que herdei de tia Mercedes, de cobrir as coisas com paninhos decorados e de pintar as unhas com base, mas de resto, sou estranha.

Durante esse tempo falei sobre tantas coisas. Sobre relacionamentos, família, filhos, saudade, trabalho. Mas senti falta de falar sobre um assunto: despedida. Talvez esse seja o momento.

Sempre achei um barato despedidas entre personagens de filmes e novelas do Manoel Carlos. Achava emocionante as lágrimas, a cena, o som de fundo. Lembro de uma cena do Maneco em que a personagem de Camila Pitanga se despedia no aeroporto do Diogo, personagem de Rodrigo Santoro. Um luxo de cena. Cabelos ao vento, caras e bocas, trilha sonora, lindo, tudo lindo. Quando a coisa toda acontece lá no Projac, é tranquilo, porque a gente desfaz a cara de choro quando chega o comercial e esquece. Mas quando esse clima de despedida acontece com a gente, o nó na garganta parece bem mais apertado.

Aqui, nesse momento toca som de caixinha de música e eu estou me despedindo de vocês.

Na minha permanência no Mulherices, vivi rodeada por pessoas que não me aturavam pela forma como eu escrevia e por pessoas que me idolatravam exatamente pelo mesmo motivo. Fui vaiada e aplaudida. Mas valeu cada comentário e confesso que aprendi com cada texto escrito. A gente começa como brincadeira, mas essa coisa de lidar com gente grande é algo sério. Eu, criatura desprovida de doçura quando o assunto é sentimento, me vi fazendo beicinho de choro algumas vezes, cada vez que surgiam comentários do tipo “não pare de escrever nunca” ou “você fez eu ver meu problema de outra forma”. Minha idéia era exatamente essa: causar sentimentos, aflorar, fazer refletir, fazer fluir algum tipo de emoção nesse povo. Faço cara de dever cumprido quando lembro o tanto de gente que me aplaudiu aqui. Fiz bem a bastante gente que veio até o Mulherices à procura de uma história parecida com a sua, e quem acabou recebendo ajuda fui eu, desabafando minhas bobagens e medos.

Comentei com vocês em forma de texto minhas dificuldades do dia a dia, os problemas dos vinte e poucos anos e confessei no texto “Dia dos Pais”, uma das maiores dificuldades da minha vida: ser mãe sozinha. Mas vi que de sozinha não tinha nada. Senti uma procissão de gente a minha volta com plaquinhas nas mãos dizendo “eu sei o que você está sentindo”, e compreendi a responsabilidade de escrever para pessoas quando recebi o seguinte comentário:

“Ainda tô com receio de comentar, mas não vou resistir. É incrível como esse texto me fez pensar, se encaixou muito em como eu fui criada. Várias críticas a mim mesma se passaram na minha cabeça: nossa, como eu fui ingrata, injusta, cega, arrogante, hipócrita. Não pude ver o tamanho da dificuldade de criar alguém sozinho, mesmo porque nunca cheguei a conversar diretamente com a minha mãe sobre isso. Obrigada, Vanessa Pinho. Obrigada, Mulherices por mais um texto maravilhoso”.

Dever cumprido mais uma vez.

Mas claro que assim como teve gente que contribuiu para o crescimento absurdo do meu ego, também teve quem me atirasse tomates.

Fui chamada de paquita da Xuxa, infantil e mal amada. Teve até gente dizendo que sou do tipo que não engravida pra não estragar o corpo, vive comendo alfaces e que meu sonho é conhecer a Disney. Quanta besteira.

Talvez eu vá mesmo até a Disney levar meus dois filhos pra passear. Talvez eu me acabe nos McDonalds, porque comer porcarias calóricas é uma das minhas alegrias. Quem sabe.

Deixo aqui um salve pra esses leitores que me acompanharam de longe, mas tão de longe que não conseguiram chegar nem perto de descobrir o que sou de verdade.

Aos que descobriram, deixo meu carinho e agradeço a cada minuto que vocês dedicaram comentando meus textos, palpitando e interagindo comigo.

Ao Mulherices: agradeço a oportunidade de me deixarem expor tudo isso e ainda me aplaudirem de pé. E a partir desse momento, quem fica na arquibancada aplaudindo vocês, sou eu.